quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Tá chato!


Sem ufanismo exagerado. Nós brasileiros estufamos o peito quando nossa veia patriótica é tocada. Nossa bandeira e nosso hino são os mais bonitos. Orgulhamo-nos de nossas belezas naturais e, até mesmo, da faca de dois gumes do nosso chamado jeitinho. É aqui que, dizem, em se plantando tudo dá; onde vive um povo pacífico, que sorri da miséria e que, como diz o comercial da TV, é o povo mais feliz do mundo. Se o homem feliz não usava camisa, o brasileiro é feliz sem sapatos, vestindo chinelo de dedo; suas mulheres são famosas pela beleza; sua música popular é conceituada (Frank Sinatra não resistiu aos encantos); o biquíni, ou a tanga, das brasileiras é modelo copiado em todo mundo (até triângulo negro interior das tangas tem modelo de corte admirado pelo mundo); o talento criativo dos nossos profissionais é conceituado; a publicidade tupiniquim conquista prêmios internacionais; o futebol é (ou era?) insuperável; deixamos de ser país subdesenvolvido e, agora, nos enquadramos entre os emergentes (ostentamos no peito, orgulhosamente, a letra B dos BRICs); somos a oitava economia do mundo, criamos o automóvel que não agride a natureza porque movido a etanol; desenvolvemos a urna eletrônica (coitada!) que nos permite conhecer o desastre em menos de vinte e quatro horas. Quanta coisa!
Mas, como está chato ser brasileiro! Ou, pelo menos, de “vivermos” (?!) o nosso atual dia-a-dia. Vocês poderão perguntar: cadê o otimismo do blogueiro? Sucumbiu?  Como tem a coragem de dizer que está chato?
Apesar de eu acreditar que “o bem é silencioso e o mal é barulhento”, repito, com convicção: está chato meeesssmo! Se desejar, posso substituir o adjetivo chato por triste, desalentador, revoltante, duro, difícil. Porém, chato define melhor o momento, porque os demais não seriam nenhuma novidade.   
Viramos diariamente a folhinha do calendário, mas estamos vendo, lendo e ouvindo, já há muitos anos, as mesmas notícias. Se a folhinha congelasse, nem daríamos conta. Está monótono. Ao menos para quem os parâmetros da verdadeira inserção no mundo desenvolvido não são representados pela maioria dos exemplos que dei no início.
Juiz assassinado com uma quantidade de tiros que mataria um regimento completo; pai de família é morto ao abrir o portão da garagem de casa; político é suspeito de fraudar...; policial é acusado de fazer parte de quadrilha de....; aumenta o consumo de crack entre os jovens; político motorista embriagado mata...; políticos adiam novamente votação de...e votam aumento dos próprios ganhos; suspense na novela prá saber quem matou...; polícia desmonta quadrilha de crianças que roubava lojas em...; ministro suspeito de se envolver em...; “saidinha” de banco mata aposentado que...; caixa eletrônico é explodido em...; após denúncias ministro renuncia ao cargo; vândalos invadem e destroem instalações e materiais de escola; responsáveis pelo escândalo político do...permanecem impunes...; presidiários escapam pela porta da frente..., criança é morta por bala perdida..., novela exibe chantagem do personagem...para se apossar de ações de empresa...
Estas outras “belezas” têm feito parte da nossa rotina. Virou prato que nos é empurrado diariamente. Mudamos de canal, viramos a página do jornal impresso ou eletrônico, a estação do rádio, as mesmas notícias, dia após dia. Claro, missão de imprensa é informar.  
Em nível internacional, mescladas com os mesmos tipos de informação, encontramos, por exemplo, população se rebela contra ditador do..., no país tal...estudantes exigem melhor qualidade de ensino, no país x cuspir ou jogar lixo no passeio público resulta em punição, no país y caminha-se de bicicleta durante a noite, sem receios, etc.
Estamos emergentes. Somos BRICs. Somos importantes no mundo do século 21, salientam bambas da Economia. E os bambas da Educação, da Ética, da Segurança, o quê nos dizem? Somos emergentes nestas áreas também? Temos uma nova classe média. Aleluia. Temos trinta e seis milhões de novos consumidores, para satisfação da Economia. E daí? Continuaremos a cuspir no chão, vender bebidas alcoólicas a menores, atirar latas de cerveja pela janela do automóvel, viajar com pneus carecas, causar acidentes por irresponsabilidade, se entupir de álcool, não no tanque de combustível, mas sim na autodestruição de neurônios que poderiam nos fazer um pouco melhores. 
Ei blogueiro pessimista, pára! No entanto, me reafirmo otimista, pois acredito que a consciência dos nossos direitos nos fará espelharmo-nos no despertar primaveril atual de povos subjugados. Com certeza despertaremos um dia neste nosso país em que chamamos de “autoridade” indivíduos que, com raríssimas exceções, sempre abusaram da credulidade deste maravilhoso e pacífico povo brasileiro. 
A titulo de exemplo, termino referindo-me ao programa da TV apresentado pela renomada, tradicional, conceituada e querida Ana Maria Braga. O programa, obrigatório nas grades de veiculação de agências e anunciantes de produtos dirigidos, principalmente, às mulheres, em particular àquelas antigamente conhecidas como as donas de casa.  Ganhou fama por dirigir-se e mostrar ao seu público temas e receitas culinárias, entrevistados abordando assuntos sociais relevantes, de variados conteúdos (sem explorar sentimentalismos baratos), artesanatos, algo de humor e artes, etc. Porém, surgiu canal concorrente, no mesmo horário,  abordando, predominantemente, a violência explícita. O programa da conceituada apresentadora voltou-se, então, às cenas e receitas de violência, em panela de pressão, vinagrete, assadas, fritas, de forno e fogão, provando que o que vale é audiência, faturamento, combater o concorrente, mesmo que engulamos o prato amargo da violência.
 Téo   
08/2011