quarta-feira, 25 de maio de 2011

Morte morrida

Morte morrida
Epa! O que é isso? Um cara que se diz otimista vem aqui falar em morte? Peraí (desculpem, esqueci a regra culta novamente). Explico. Encasquetei por ver em obituários o enorme percentual da causa mortis atribuída à “falência de múltiplos órgãos”.
Caramba! Quanta gente morre por FMO! Apesar de formado em área de ciências biológicas, sempre imaginei que o laudo era um subterfúgio do emissor do documento legal para justificar o injustificável, não dizer que foi “morte morrida”. Morrer, verbinho que nós, mortais, temos horror de empregar (ou de sentir, quem sabe?).  Convenhamos a bem da verdade, não daria para dizer nestes casos que foi de causa real desconhecida, nem de morte morrida. Pegaria mal e, além do mais, seria uma inverdade científica. Para minha surpresa e confirmação da minha ignorância no assunto, fui buscar mais informações e constatei que, tecnicamente, a FMO é um quadro mórbido, também conhecido como “insuficiência de múltiplos órgãos”, designação sob a qual consta no CID (= Classificação Internacional de Doenças). Fui, então, mais a fundo e encontrei a seguinte menção em revista especializada científica:
“com relação à mortalidade, as estatísticas revelam que quando apenas um órgão é insuficiente, está em torno de 25% a 30%, aumenta para 50% com dois órgãos, 75% com três órgãos e 100% quando quatro órgãos entram em falência”.
Incrível, não?! Quando quatro órgãos falirem, simplesmente você morreu. A pesquisa só fez confirmar minha impressão do pseudo subterfúgio constante do atestado de óbito (claro, com todo respaldo da ciência). Por que então este tema na pauta de um blogueiro otimista? Porque vejo neste assunto escolhido, uma desesperada fuga de nós mortais em encarar de frente tudo o que se refere ao mais inevitável dos eventos da vida. A morte. Chegamos, inclusive, a contra-sensos, como o de olhar para ela muitas vezes com mórbido prazer, a encarar com indiferença a avassaladora atual banalização da vida. Há uma distorção enorme nisto tudo. Penso que se encarássemos a “dona coisa” sem preconceitos, fato da realidade, evento inevitável, a vida correria melhor, mais prazerosa, valorizando mais e entendendo a vida.
Pela atualidade do fato, por termos todos compartilhado, vivido junto mesmo, a luta até bem humorada pela sobrevivência do bravo, valente, vice-presidente José de Alencar, transcrevo manchete publicada pela Agência Estado em 29/03/11, e elaborada com texto extraído do próprio boletim médico do hospital onde faleceu – morreu – desencarnou – expirou – nosso Alencar:
“José de Alencar morreu de câncer e falência de múltiplos órgãos”. Não bastaria dizer: “morreu de câncer”? Câncer? Outra palavrinha (ou palavrão?) impregnado de outros preconceitos. Mas, então ela encontrou-se na manchete com a FMO que justificou o................ desenlace.
Téo 05/2011  

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